tag:blogger.com,1999:blog-59896792024-02-07T02:12:18.622-03:00Uma luz nas trevas da estupidez humana.Matatashttp://www.blogger.com/profile/08379173464820181868noreply@blogger.comBlogger54125tag:blogger.com,1999:blog-5989679.post-46048645180000964692008-09-01T08:35:00.003-03:002008-09-01T08:40:01.030-03:00New BlogPessoal, tenho um blog novo (em inglês) chamado <a href="http://mildmisanthrope.tumblr.com/">Mild Misanthrope</a>, confiram agora!<br /><br />Blogging in English now, it's called <a href="http://mildmisanthrope.tumblr.com/">Mild Misanthrope</a>, check it out<span style="font-weight: bold;">.</span><span style="font-weight: bold;"></span>Matatashttp://www.blogger.com/profile/08379173464820181868noreply@blogger.com5tag:blogger.com,1999:blog-5989679.post-60709153984107609692008-08-06T21:06:00.001-03:002008-08-06T21:10:25.898-03:00Back To SchoolDe acordo com um ditado no mínimo questionável da Polícia Civil, para manter-se um segredo entre três pessoas, só matando duas. Nunca fui bom em guardar segredos, sempre sentia uma inquietação desesperadora até soltar tudo, em geral exatamente para as pessoas erradas, em geral segredos dos outros.<br /><br />O lado positivo disso é que as pessoas aprenderam a não dividir nenhuma informação sensível comigo, o que me livra de ouvir casos longos e entediantes sobre pequenos recortes insignificantes das vidas das pessoas. O lado negativo é óbvio; sou um livro no mínimo entreaberto; praticamente todo mundo que conheço sabe que sou circuncisado e que choro toda vez que assisto a <span style="font-style: italic;">Um Lugar Chamado Notting Hill</span>.<br /><br />Por isso fiquei impressionado com minha capacidade de guardar um segredo durante anos, e não dividí-lo com absolutamente ninguém, nem aqueles nearest and dearest, e agora resolvi abrir o jogo e confessar que não terminei meu curso superior. No final de 2004 faltavam quatro matérias (que agora são nove graças a mudanças curriculares), e foi uma escolha entre ir embora para Berlim e ficar mais um semestre adiando a vida. Felizmente não fui burro o suficiente para ficar.<br /><br />O que tornou esse segredo algo especial é que não só o mantive, mas menti agressivamente para todo mundo; mais importante que isso, menti para você, que está lendo esse post sentindo horror e surpresa. Só não peço desculpas por isso porque provavelmente não foi a primeira vez que menti para você, e certamente não será a última, e espero que não seja a última vez que alguma coisa aconteça que te cause horror e surpresa. Uma vida sem horror e surpresa é um tédio.<br /><br />O único motivo mesmo para confessar é que agora voltei para a PUC e vou terminar, em um semestre, nove matérias. Manhã, tarde e noite. A ironia é que voltei agora que decidi que propaganda não é um uso digno de capacidade intelectual e que não quero trabalhar com isso nunca mais. Go figure.<br /><br />Depois que percebi o tanto de conexões interpessoais entre pessoas PUC e pessoas Vida Real, saquei que estava fudido, condenado a ser descoberto aos poucos, e ter que explicar tudo para cada um que perguntasse, então resolvi fazer um post preventivo, e (tentar) evitar longas e entediantes conversas sobre tudo isso.Matatashttp://www.blogger.com/profile/08379173464820181868noreply@blogger.com10tag:blogger.com,1999:blog-5989679.post-40129905752310460232008-04-01T01:46:00.005-03:002008-04-01T02:13:02.661-03:00A Saga do Viking de Cabelo EncaracoladoA cultura pop tenta nos convencer da sensualidade charmosa dos extremos e de que o segredo da felicidade é viver cada dia como se fosse o último, endeusando a idéia de uma vida repleta de excessos sem conseqüências. A imagem clássica do herói <span style="font-style: italic;">junkie</span> acordando, acendendo um cigarro e matando a meia garrafa de cerveja que sobrou ao lado da cama é provocativamente charmosa. Ainda mais considerando que estamos protegidos dos aromas e dos vexames públicos típicos de alguém que acorda acendendo um cigarro e matando a meia garrafa de cerveja que sobrou ao lado da cama.<br /><br />Ao mesmo tempo retrata ícones que se dizem virgens e abstinentes de drogas e álcool como heróis das tentações do mundo, glorificando-os para as massas menos ousadas e mais ligadas a valores tradicionais. Beatificam a imagem de pessoas que acreditam em Deus e amam a família, transformando mais um extremo em algo também atraente e inatingível, já que estamos protegidos da chatice e do tédio de conviver com uma beata insuportável.<br /><br />Como se não fosse o suficiente, somos bombardeados com reality shows que elevam à estratosfera da fama pessoas absolutamente comuns e medianas, nem animais selvagens sedentos por prazer sem escrúpulos ou restrição nem criaturas travadas e presas em moldes sociais tão fortes que não reconheceriam diversão se fossem enrabadas por ela com uma <span style="font-style: italic;">dildo</span> preto de borracha.<br /><br />Qual a lição? É tudo mentira. Tudo que é vomitado pelas redes de televisão, pelas gravadoras e pelos estúdios é uma pilha de merda quente pasteurizada corporativa, orientada para convencer um certo público a comprar uma certa porcaria qualquer, de vodka a <span style="font-style: italic;">laptops</span>, de bíblias a cremes de celulite, o milagre da propaganda. Como diz o grande George Carlin, "<span style="font-style: italic;">advertising is the businessman's cheaply-dressed, five dollar blowjob</span>".<br /><br />Isso tudo é atingido nos mostrando como deveríamos ser, explorando nossas fraquezas. Somos todos claramente falhos e inadequados, pecando sempre por excessos ou faltas de características. As pessoas são altas, baixas, gordas, magras, têm cabelos lisos ou ondulados, olhos claros ou escuros, pele branca, amarela, preta, vermelha ou azul (essa eu inventei), mas sempre estão unidas por um denominador comum, que é a falta. Temos buracos enormes a serem preenchidos por sexo, comida, drogas, religião, academia, plática ou consumo. Nossos excessos mascaram nossa insatisfação e nossa inadequação perante a vida.<br /><br />Mas não precisamos de extremos para nos sentirmos bem. Viver eternamente frustrado não é interessante, mas pular fora de todo o grande <span style="font-style: italic;">freak show</span> da sociedade contemporânea não é a solução. Nada mais desagradável que alguém que <span style="font-style: italic;">realmente</span> não precisa da aprovação alheia, já que pessoas assim não se preocupam com nada, inclusive higiene pessoal e bons modos à mesa.<br /><br />Ser você mesmo, então, é inconcebível. Você provavelmente não é uma pessoa tão interessante assim, já pensou nisso? A chave é buscar o que é possível. É ser você, só que do jeito que você deveria ser.<br /><br />Dizem que o grande desespero de todo cabelereiro é quando entra uma mulher com cabelo liso e preto segurando alguma revista de moda aberta numa foto de uma loira cacheada. Imagine se fôssemos sem pudor em todas as situações de alteração pessoal? Consigo ver o suor frio na testa de um cirurgião plástico vendo a Preta Gil entrar no consultório com uma foto da Naomi Campbell, ou de um Personal Trainer vendo, bem, a Preta Gil entrar na academia com uma foto da Naomi Campbell.<br /><br />Um homem magrelo baixinho nunca vai parecer com o Sawyer do <span style="font-style: italic;">Lost</span>, e um grandalhão gordão nunca vai parecer com aquele menino do <span style="font-style: italic;">Juno</span>, assim como ninguém nunca vai parecer com o Brad Pitt nem com a Angelina Jolie nem com toda aquele mar de caipiras do Kansas que mudaram para Los Angeles e transaram com as pessoas certas e agora são referência de alguma coisa. E, claro, a Preta Gil nunca vai parecer com a Naomi Campbell.<br /><br />Mas um cara com 1,80 meio gorducho pode virar um viking, gordo e forte, igual ao Paul Sr. do <span style="font-style: italic;">American Chopper</span>. Já viu o braço do cara? Parece uma coxa pendurada no ombro. Vamos parar de idealizar pessoinhas do Kentucky que sabem fingir durante duas horas que são soldados ou advogados ou uma jovem apaixonada ou um capitão de nave espacial. Escolha alguém quase parecido com você. Vamos escolher <span style="font-style: italic;">role models</span> viáveis, e sermos felizes sendo (quase) nós mesmos.Matatashttp://www.blogger.com/profile/08379173464820181868noreply@blogger.com9tag:blogger.com,1999:blog-5989679.post-90364608668654597152008-03-28T03:54:00.004-03:002008-03-28T04:02:13.270-03:00A Sabedoria JecaUma tarde abafada com pesadas nuvens cobrindo o céu enquanto o Matuto observa, calmo e composto, de cócoras, o movimento dos pássaros. Empurra sutilmente o chapéu de palha para trás, passa o cigarro enrolado do lado direito para o lado esquerdo da boca, coça o queixo e afirma, categórico:<br /><br />– Uai, sô, hoje chove.<br /><br />Ah, delicada Sabedoria Jeca, tão útil e atraente como câncer testicular. Aquela maravilhosa habilidade de prever chuva, saber como transformar um galho quebrado de goiabeira numa muda e compreender a sutil diferença de aroma e sabor que separa frutas de sacolão das colhidas no pomar na roça.<br /><br />Assim, é gerada toda uma mística em torno da vida no campo e da discreta sabedoria do roceiro humilde, uma pessoa simples e prática e, justamente por isso, dotada de uma compreensão pragmática e profunda do espírito humano; quase um personagem do Morgan Freeman.<br /><br />Cria-se então uma supervalorização das coisas simples da roça, aquele café ralo e doce, aquelas botinas com sola de pneu, aquele despertar às 4 da manhã. Uma glorificação do interior de Minas Gerais, terra boa e acolhedora, onde qualquer festa, feriado ou simples sexta à noite é desculpa para beber cachaça e cerveja até a inconsciência, por falta completa de qualquer outra opção de lazer. Ainda mais depois que os cinemas viraram igrejas, prontas para acolher quem bebe demais e precisa mudar a vida - e o ciclo se fecha.<br /><br />Assim como o Windows é uma elegante ferramenta para provar que as pessoas conseguem se acostumar com praticamente qualquer tipo de sofrimento, a sabedoria jeca é um meio de destruição da vida humana enquanto experiência estética prazerosa.<br /><br />O poder de atração da silenciosa filosofia fazendeira nos seduz, e nos convence de que há, ali, algo de valor. Temos luz elétrica. A sociedade pode funcionar a qualquer hora, manhã, tarde e noite. Mesmo assim, insistimos em obrigar as pessoas a acordarem em horas desumanas, como 6 ou 7 da manhã. Por que? Porque desde 5 mil anos atrás os fazendeiros (leia-se quase todo mundo até o século XIX) acordam de madrugada.<br /><br />Sábios? Não, apenas pessoas que precisam tirar leite das vacas. A simples função de uma categoria profissional, hoje bem menos expressiva, ditou as normas do mundo por milênios. Prova maior da estupidez humana não há (talvez o Windows).<br /><br />Ninguém atende o telefone em casa e diz “Bom dia, meu nome é Fulano, em que posso ajudar?”, nem sai do trabalho na hora do almoço para pegar o carro e dirigir lentamente pelas ruas enquanto os amigos jogam sacolas de plástico cheias de lixo no porta-malas.<br /><br />Quem faz isso são atendentes de <span style="font-style: italic;">call center</span> e lixeiros. E quem acorda de madrugada são fazendeiros. Está na hora de abandonar a sabedoria jeca e adotar de vez a sabedoria urbana.<br /><br />Não sei fazer muda de planta, mas sei fazer um Dry Martini espetacular. Nunca consegui olhar para o céu e saber se ia chover, mas consigo olhar para um email e saber que é mentira, não vão cancelar minha conta no Messenger ao menos que eu clique naquele link.<br /><br />O que eu sei é que são quase quatro da manhã e não dormi ainda, mas tudo bem, meu leite não vem de vaca, vem de Tetrapak.Matatashttp://www.blogger.com/profile/08379173464820181868noreply@blogger.com17tag:blogger.com,1999:blog-5989679.post-52793168354650240132008-03-18T00:43:00.002-03:002008-03-18T01:03:10.625-03:00Naomh PádraigTudo começou em um dia de São Patrício. Meio a um porre colossal, Godofredo começara a balbuciar incongruências ininteligíveis, certamente derivadas do consumo de exatamente 574 mililitros de álcool etílico, espalhados de forma irregular por diversas garrafas de cerveja e inúmeras doses de whisky. Seus amigos – Arnaldo, consumidor orgulhoso de 485 mililitros e Estêvão, puxando a frente com 693 mililitros – imbuídos pelo espírito católico irlandês do dia 17 de Março, data na qual é venerado o santo Naomh Pádraig pelo simples fato de nela ter morrido, convenceram Godofredo de que não eram apenas resmungos de bêbado, e sim uma dialeto obscuro do irlandês arcáico falado apenas pelo santo. Godofredo acreditou em seus dois supostos amigos e passou a ter certeza de ser a reencarnação do santo e que sua missão seria destruir toda a delicada mitologia proposta pela igreja católica com sua teia de mentiras e ganância, trazendo uma nova era de paz e espiritualidade, coisas que raramente andam juntas.<br /><br />Ironicamente, Godofredo ignorava (como ignoraria pelo resto de suas poucas horas no planeta) ser descendente direto do Papa São Gregório VII, seguindo a linhagem de um filho bastardo jamais visto pelo pai, que certamente reviraria na cova ao saber que um de seus descendentes andara pregando reencarnação. No caso quem reviraria seria o papa, já que o filho fôra apenas um camponês insignificante desprovido da capacidade analítica necessária para compreender a gravidade da existência de tal fenômeno para os pilares da fé católica.<br /><br />Mais pertinente seria notar que Godofredo também ignorava seu transtorno dissociativo de identidade latente, que só agora aflorara em toda sua resplandescente glória.<br /><br />Subitamente transformado em santo, Godofredo ergueu-se glorioso da cadeira, para espanto de Arnaldo e Estêvão, subiu desajeitadamente no tampo de fórmica que imitava madeira da mesa e começou um discurso colossal, estrondoso, que faria as bases de toda a sociedade desabarem e daria início a uma Nova Era da Humanidade, uma era de compreensão e fraternidade em que o amor prevaleceria e a solidariedade dimensionar-se-ia como a grande moeda de troca da espécie humana. Ditadores cruéis e terríveis cairiam, injustos se arrependeriam e dedicariam suas vidas ao bem, o poder escorreria das mãos dos poucos nas quais esteve concentrado durante quase toda a história humana e desapareceria para sempre para permitir a igualdade; todos seriam livres, felizes e contentes para todo o sempre, sem precisarem de dor, sofrimento e agonia. Um discurso para salvar a humanidade, iluminar as trevas e trazer ordem ao caos.<br /><br />Infelizmente, Godofredo estava convencido ser um santo irlandês, e todo o discurso de quase duas horas foi feito em grunhidos e resmungos que o jovem herege presumia serem irlandês arcáico. Arnaldo e Estêvão, temendo a intervenção violenta de alguns freqüentadores menos iluminados do bar haviam desaparecido, e a única coisa que ruiu por terra graças à grandiloqüência de Godofredo foi a mesa sobre a qual discursava, partindo-se em três pedaços e lançando o santo destronado ao chão, onde bateu a cabeça e morreu em segundos, nunca descobrindo que não existe reencarnação, não existe paraíso e não existe Deus, apenas um chão de linóleo e uma escuridão eterna.<br /><br />O garçom que tentou socorrê-lo, ao ver que não havia nada a se fazer, roubou sua carteira, provando de uma vez por todas que não tem jeito mesmo e que estamos todos fudidos por toda a eternidade, boa noite.Matatashttp://www.blogger.com/profile/08379173464820181868noreply@blogger.com10tag:blogger.com,1999:blog-5989679.post-41442084728710939252008-03-12T15:21:00.002-03:002008-03-13T11:31:23.300-03:00O Não-PaísEm 1963, franceses que pescavam lagosta ilegalmente na costa brasileira foram presos e gentilmente devolvidos à França. Irritado, o então presidente Charles de Gaulle teria dito “O Brasil não é um país sério”. O que não faria sentido; um país que fiscaliza sua costa e repreende práticas ilegais pode ser considerado bastante sério. Só começa a fazer sentido quando descobrimos que a frase foi suavizada pelo então embaixador brasileiro na França, Carlos Alves de Souza Filho.<br /><br />A frase original proferida por de Gaulle seria “O Brasil não é um país”. Ou seja, fodam-se os limites de águas territoriais brasileiras, foda-se a polícia, foda-se a diplomacia, nem é um país.<br /><br />Faz sentido.<br /><br />Desde então, as únicas fontes fidedignas de informações e opiniões sobre o Brasil (tirando Diogo Mainardi, o último ser humano sensato de nosso não-país) têm sido publicações estrangeiras.<br /><br />O New York Times publicou um artigo em Dezembro de 2007 que resumia toda a situação do Renangate em alguns poucos parágrafos. Era objetiva, direta e, mais importante, sem rabo preso. Por motivos óbvios; não consigo imaginar por qual motivo o New York Times colocaria panos quentes em qualquer coisa relacionada ao Brasil.<br /><br />Um relatório do Departamento de Estado norte-americano desceu o cacete no Brasil por causa de coisas típicas desse não-país, como corrupção, simbolizada pela mais recente afronta à inteligência humana, que é o não linchamento de nosso estimado criminoso, ex-Presidente do Senado), impunidade (mais uma vez, lá estava Renan) e violência policial (mais precisamente, o caso da menina de 15 anos de idade encarcerada com 20 homens em um não-estado do nosso não-país, que, claro, foi abundantemente estuprada).<br /><br />Qual conclusão podemos tirar disso tudo, tirando a óbvia, de que o Brasil não é um país viável? A conclusão é que a imprensa brasileira tem o rabo preso de forma quase criminosa. Seja por pressões de nossos dirigentes eleitos, seja por auto-censura, os jornais do Brasil lidam de forma excessivamente comedida com a realidade política do país.<br /><br />Tirando o Estado de Minas, mais proativo em suas atitudes, que ignora agressivamente qualquer fato negativo do Governo do Estado. Se Aécio Neves peidasse durante uma comitiva, a manchete no dia seguinte seria “O Doce Aroma da Boa Liderança”. O que mais me incomoda é que considero Aécio Neves um governante acima da média, e votaria nele para Presidente da República sem pestanejar, mas é um absurdo o jornal de maior circulação do estado ficar ajoelhado com o pau dele na boca. Na verdade é um absurdo o jornal de maior circulação do estado ser a merda que é. Minhas condolências a todos (os quatro ou cinco) jornalistas de verdade que trabalham para o grande jornal dos mineiros.<br /><br />Minhas condolências a todos os seres humanos semi-racionais que povoam nosso não-país.Matatashttp://www.blogger.com/profile/08379173464820181868noreply@blogger.com18tag:blogger.com,1999:blog-5989679.post-68235371066637466502008-02-19T11:13:00.003-03:002008-02-19T11:26:06.649-03:00Três Formas de OdiarEste texto é um pouco diferente do padrão; são três temas que já tentei desenvolver sem muito sucesso, talvez por serem idéias excessivamente sucintas. De qualquer forma, são três pequenos textos embolados em um só, então certamente tem alguma coisa para ofender a todo mundo.<br /><br /><span style="font-style: italic;">Ficção é Mais Estranha que a Realidade</span><br /><br />Sempre fico abismado quando vejo algum filme cheio de pontas soltas e situações confusas que, de repente, se amarram e encaixam e tudo fica perfeito.<br /><br />Fico abismado, na verdade, com as reações das pessoas. Elas ficam impressionadas mesmo, como se fossem coincidências reais e loucas (“aí o menino descobre que ele sempre odiou brócolis porque o pai dele o obrigava a comer brócolis, por isso que ele matou o fazendeiro que plantava brócolis, mas o pai dele era amigo do policial que procurava pelo assassino do fazendeiro de brócolis e o irmão do fazendeiro blá blá blá”).<br /><br />É FICÇÃO. Qualquer coisa que você quiser que aconteça, pode acontecer! Que tal pensar na competência do roteirista ao invés de ficar parado na porta do cinema conversando com outros idiotas comentando que loucura que o cara era pai do cara que era irmão do outro que na verdade era o cara que matou o cara?<br /><br /><br /><span style="font-style: italic;">Alguns mais iguais que os outros</span><br /><br />O Brasil é um país tão racista e individualista que, quando zilhões de crianças negras pobres morrem em decorrência do tráfico e outras formas de violência, é só estatística. Quando um menino branco de classe média morre arrastado por um carro em decorrência de um assalto mal executado, o Brasil inteiro entra em comoção, gritando e esbravejando.<br /><br />"Atores" de novela vestem camisetas brancas com palavras como PAZ e JUSTIÇA e, ocasiosalmente, pombos brancos, e pedem o fim da violência. Como se pombos não fossem ratos alados, vetores de milhares de doenças, e como se fosse uma escolha consciente a degradação urbana brasileira.<br /><br />Claro, existe a violência porque os atores de Malhação não haviam <span style="font-style: italic;">pedido</span><span> que reinasse a paz. Agora sim, teremos tranquilidade, não vai nem precisar de trancar a porta à noite. Eles querem PAZ (parar de comprar pó eles não querem, mas querem paz).<br /></span><br /><br /><span style="font-style: italic;">Monogamia Poligâmica</span><br /><br />Monogamia é fundamental para a vida humana, assim como para a existência de toda a espécie. Mesmo quando é poligâmica.<br /><br />Imagino que em boa parte dos casos, relações poligâmicas são escondidas e secretas, mantidas até o túmulo. Ou pelo menos até logo antes do túmulo, quando a Outra aparece com dois filhos e se apresenta para a esposa na beira do caixão. Esporadicamente, nos confrontamos com uma poligamia aceita; isto é, uma poligamia explícita e pacífica. Três mulheres morando na mesma casa, com um cara, ou algo do gênero. Elas aceitam isso, é algo conhecido e tolerável. Um dia come uma, outro dia come outra, um dia, quem sabe, até come as três juntas.<br /><br />Mas deixa esse cara sair e comer uma outra. Morte na certa.Matatashttp://www.blogger.com/profile/08379173464820181868noreply@blogger.com9tag:blogger.com,1999:blog-5989679.post-42512755847547685172008-02-12T11:03:00.000-02:002008-02-12T11:23:37.385-02:00HortifrutigranjeirosVivemos num país de conto de fadas. Não um lugar lindo com um rei justo e uma princesa esperando o amor verdadeiro, mas uma distopia vivendo à base de mitos idiotas e sonhos surreais. O sentimentalismo e a demagogia dominam o país, e o falso moralismo corrói a sociedade como um câncer. Como diz meu amigo SaintCahier, “[Povo] mais bunda que o brasileiro, eu desconheço.”<br /><br />Em várias incidências vemos a bundice brasileira em ação: não fuzilar os integrantes do MST, não esfolar vivas ministras da economia que confiscam seu dinheiro, não linchar em praça pública os generais e torturadores da ditadura, levar a sério Big Brother. Mas em nenhum caso a manifestação do brasileiro bunda-mole é mais grave que nossa relação com hortifrutigranjeiros.<br /><br />Sério? Sério. O sacolão define perfeitamente a essência do povo brasileiro enquanto consumidor e, como conseqüencia, cidadão. Se americanos nervosos ocasionalmente entram armados no McDonald’s e abrem fogo na galera, deveríamos fazer o mesmo em sacolões Brasil afora.<br /><br />Temos diversos climas no país, propício ao cultivo de praticamente todo tipo de fruta e legume, e mesmo assim só temos merda no sacolão. Bons exemplos são frutas que saem ligeiramente do tropical, como pêssegos e maçãs e morangos e amoras, que são de qualidade lamentável na terra da manga e do abacaxi (talvez as únicas duas coisas que prestam no Brasil).<br /><br />O que isso tem a ver com a personalidade coletiva do brasileiro? Mostra como aceitamos consumir qualquer merda que seja enfiada goela abaixo, qualquer maçã massuda ou pêssego duro. Não somos consumidores exigentes, isso é mais que claro. Aceitamos pagar o triplo que um americano paga numa televisão (mesmo sendo fabricada na China), e ainda agüentamos o gerente semi-analfabeto da Ricardo Eletro explicando como funciona a política de troca da loja e que ele não pode fazer nada quando a TV estraga. Somos consumidores fracos e estúpidos.<br /><br />É muito fácil rir da mania dos europeus de pagarem 5 euros numa manga e comerem bananas verdes, que jogam fora assim que aparecem pequenas pintinhas pretas (ou seja, quase pronta para comer), mas eles exigem qualidade suprema em televisões, máquinas de lavar roupa e hortifrutigranjeiros. Nós somos idiotas, o que é comprovado pelo nosso comportamento em relação ao tomate.<br /><br />O tomate é a quintessência da estupidez brasileira. Além de só termos dois tipos de tomate (aquele grandão sem gosto de nada e aquele pequeno com gosto de agrotóxico), compramos verde e jogamos fora maduro. É verdade, e você sabe disso. Não tente negar. É inadmissível um tomate manchado de verde chegar à mesa. Tomates são vermelhos, porra. Vermelhos, não verdes, não amarelados, e sim VERMELHOS.<br /><br />Tomates não devem ser consumidos duros e verdes, devem ser consumidos firmes e vermelhos. Geralmente quando chegam ao ponto certo, são jogados fora, porque passaram do ponto. Passaram de onde, do ponto de quase maduros?<br /><br />Como sempre, existe um lado positivo. A vantagem da estupidez tomatal do povo brasileiro é que nós, os seres humanos sensatos do Brasil, podemos comprar tomates maduros em qualquer sacolão, desde que cheguemos depois das idiotas que compram verde e antes dos funcionários que jogam fora maduro.<br /><br />Respeitem o tomate. O tomate é nosso amigo, principalmente maduro.Matatashttp://www.blogger.com/profile/08379173464820181868noreply@blogger.com8tag:blogger.com,1999:blog-5989679.post-47551598713042939502008-02-08T11:28:00.000-02:002008-02-08T11:34:04.101-02:00In nomine Patris et Filii et Spiritus Sancti03:57 no despertador, acordo gritando. Dez anos matando gente e todo dia acordo gritando. Vejo cada rosto que já matei. Só tenho paz quando encontro com Cândida, e apanho.<br /><br />Maldita criação católica. Só aplaco a culpa com penitência. Sangramento, hematomas, ocasionais fraturas, igual nos velhos tempos. O papa ficaria orgulhoso, velho louco. O pecado da luxúria, pequeno preço a pagar.<br /><br />Mas há três dias não vejo Cândida. A capa de chuva e as luvas de látex esquecidas na valise, só me resta suar, gritar e dormir em pequenos intervalos entre os pesadelos. Preciso apanhar hoje, a exaustão está fora de controle.<br /><br />Abro a porta do prédio e subo de escada até o terceiro andar. Minha mão segurando a valise está suada, cheia de más intenções. Será que o paraíso está repleto de más intenções, para contrapor ao inferno?<br /><br />Não me dou ao trabalho das luvas nem da capa. Entro silenciosamente, não quero que Cândida me veja ainda. Quero assustá-la, assim apanho mais. Talvez até uma fratura, por acordá-la de madrugada. Uma fratura são duas semanas dormindo em paz.<br /><br />A fresta da porta do quarto mostra luz. Estranho. Cândida não tem pesadelos, criada pagã. Inveja. Mais um pecado. Vou direto para o inferno.<br /><br />Cândida conversa com alguém. Alguém homem. Escuto tudo, do outro lado da porta. Estão contentes, vão poder ficar juntos agora que o marido dela está morto. Assassinado no banheiro da empresa onde trabalha. Garganta cortada por um homem com capa de chuva.<br /><br />Um homem que vai pro inferno. Ainda mais agora, depois voltar à cozinha do apartamento, pegar uma faca e passar mais de duas horas esquartejando os dois, nus, na cama. Trabalho até o sol raiar, fazendo uma piscina de sangue no chão do quarto. Manchando minha roupa, e minhas mãos. Minha roupa desprotegida, sem capa, e minhas mãos expostas, sem luvas, sujas de sangue. Lavo as mãos, mas o sangue mancha, não importa o quanto eu esfregue.<br /><br />Saio do prédio, finalmente vestindo a capa de chuva para me proteger das gotas enormes caindo. Tenho esperança que me protegerá também do raio que, certamente, um dia me fulminará. Maldita chuva, maldito trabalho, maldito Deus, maldita Cândida.Matatashttp://www.blogger.com/profile/08379173464820181868noreply@blogger.com6tag:blogger.com,1999:blog-5989679.post-33372814114339080252008-02-01T02:49:00.001-02:002008-02-01T03:12:11.249-02:00Cândida– Pra onde vamos, chefia?<br />– Getúlio Vargas com Alagoas.<br /><br />Abro o jornal e finjo ler alguma matéria sobre os novos avanços da NASA na tentativa de criar um habitat viável para colonização da lua e, futuramente, planetas (não está indo bem, dá pra ver pelas entrelinhas da matéria), tudo para evitar conversa.<br /><br />Momento de foco e concentração, preparando para o encontro final com Cândida. Semanas de preparação, cuidado extremo. Tudo para ganhar confiança e me aproximar.<br /><br />– Você viu o jogo ontem? Porra, que pelada, hein?<br /><br />Nem escuto o imbecil dirigindo o táxi. Estou preocupado. Não me preparei adequadamente. A certeza inabalável me assola. Começo a sentir aquele calafrio estranho, um gelado na barriga e arrepio na nuca. Fecho os olhos e respiro, tentando controlar o pânico.<br /><br />Sinto o suor brotando na testa, todos meus músculos travando. Sei que o motorista está me olhando pelo retrovisor. Pelo menos agora acho que não vai tentar puxar papo.<br /><br />Minha última chance hoje. Após semanas, tentando entender todos os códigos e tirar tudo que poderia de Cândida, chegou o momento inevitável, e preciso me controlar.<br /><br />Minha mão esquerda desliza até a sacola ao meu lado no banco de trás. Escorrego os dedos para dentro. Cada objeto identificado me acalma um pouco, a respiração volta ao normal, depois de alguns minutos abro os olhos e sorrio.<br /><br />– Tá tudo bem aí, cara?<br /><br />Continuo sorrindo e ignorando. Chegamos, pago o dobro que devo e desço.<br /><br />O prédio conhecido, abro o portão com minha chave. Cândida mora no 301, subo de escadas e paro no corredor. Preciso ser rápido, nenhum vizinho pode passar enquanto me preparo. Em segundos, pesco um par de luvas de látex no bolso do paletó, visto, abro a sacola e visto a capa de chuva que estava lá dentro, visto os óculos de proteção presos com um elástico branco por trás da minha cabeça. Abro a porta do apartamento. Finalmente chegou a hora.<br /><br />Adiar prazer? Expectativa aumenta a emoção de conseguir algo? Sofra agora, deleite-se mais tarde? Parece muito cristão. Penitência é para idiotas. Fodam-se os sete pecados e o paraíso depois, quero prazer constante. Quero sobremesa antes e depois do jantar.<br /><br />Com Cândida não foi assim. Semanas de preparação, estudando seus hábitos, me preparando para o momento apoteótico que se aproximava, finalmente.<br /><br />Fecho a porta, silencioso, vejo Cândida parada no centro da sala, de costas para mim, observando algo que segura nas mãos e que não vejo. Avanço lentamente, medindo cada passo. O tempo pára. Estou a cinco passos dela. Quatro. Três. Dois.<br /><br />– DEITA! – berra Cândida, virando rapidamente, me batendo na cara com a cinta que examinava – JUNTO, maldito escravo imprestável! Matou o homem da foto?<br /><br />Caio de joelhos, o sangue escorre nariz abaixo, resultado da primeira cintada. Abano a cabeça em afirmação.<br /><br />– Bom escravo! De prêmio, vai lamber minhas botas, seu porco imundo!<br /><br />Cândida termina de me jogar no chão, sempre batendo, batendo, pquenas gotas de sangue caindo do meu nariz na capa de chuva de plástico transparente, eu me ajoelhando e lambendo suas botas de couro, pretas e novas, sentindo lágrimas de felicidade brotando dos meus olhos e a sensação de finalmente conseguir o prazer que tanto queria me preenchendo por todo.Matatashttp://www.blogger.com/profile/08379173464820181868noreply@blogger.com9tag:blogger.com,1999:blog-5989679.post-70202846633300315892008-01-29T00:32:00.000-02:002008-01-29T00:34:19.748-02:00GravatasRealidade não deixa margem para especulação, é a puta de luxo do pragmatismo. Esqueça discussões sobre aborto, é um cabide tentando puxar o feto. Esqueça especulações e análises sobre violência urbana, é o cano de uma nove enfiado goela abaixo e um malaco suando frio de abstinência de pedra arrancando seu dinheiro.<br /><br />Esqueça anedotas sobre situações desagradáveis em aviões, é um executivinho de merda na poltrona ao lado, tentando puxar papo comigo desde que a aeromoça terminou de explicar o que fazer no caso de despressurização (coloque a máscara sobre o rosto, prendendo o elástico atrás da cabeça).<br /><br />Quarenta desesperadores minutos depois e finalmente pousamos (favor manter telefones celulares desligados até desembarcarem da aeronave), sãos e salvos, apenas um pouco amarrotados e com pés inchados.<br /><br />--<br /><br />Assim que ligo o celular, uma mensagem de texto aparece com a hora e o lugar da reunião. Arrumo o nó da gravata, aliso o paletó e saio para o terminal antes de todo mundo. Não tenho bagagem.<br /><br />Acho o motorista com meu nome na placa logo no desembarque (sou eu, não tenho bagagem nenhuma).<br /><br />No banco de trás do carro está a valise com tudo que vou precisar durante o dia, e o motorista já foi instruído sobre meu trajeto.<br /><br />--<br /><br />Os trinta andares do prédio estão abarrotados de pessoas. Diretores, estagiários, contadores, executivos e trainees, empenhados em ganhar dinheiro, passar o dia, subirem na empresa.<br /><br />Tiro um crachá da valise, prendo no paletó, cumprimento o porteiro com um aceno de cabeça (bom dia, senhor). Entro no elevador e subo até o vigésimo-quinto andar, praticamente deserto, exceto pela sala de reuniões.<br /><br />Passo direto pela porta e vou até o banheiro. Quatro mictórios, três pias e duas privadas. Me tranco dentro de um dos cubículos. Uma privada, um rolo de papel higiênico e um gancho para pendurar sabe-se lá o quê.<br /><br />De dentro do bolso do paletó tiro um par de luvas de látex, vestindo-as com cuidado. Da valise sai uma capa de chuva de plástico transparente, que visto também, abotoando-a até em cima.<br /><br />Agachado na privada, para não ser visto de fora, aguardo.<br /><br />--<br /><br />Treze pessoas passam pelo banheiro em quarenta e sete minutos. Vejo-as pela fresta da porta. Algumas sozinhas, cantarolando (…quero descansar, ir ao cinema com você, um filme à toa…), outras acompanhadas, absortas em conversas óbvias (…aí falei com ela, porra, eu não sou uma máquina de ganhar dinheiro, você precisa ter um pouco de…). A décima-quarta pessoa corresponde exatamente à foto que tiro de dentro da valise. Exatamente o executivinho de merda que me amolou o vôo inteiro.<br /><br />Coincidência louca, penso, enquanto abro a porta, puxo a faca de dentro da valise e corto a garganta do alvo, seja ele quem for, esguichando sangue na capa de chuva que tiro rapidamente, junto com as luvas, jogando tudo no lixo e saindo do banheiro, valise na mão, ajustando o nó da gravata, alisando o paletó e me preparando para pegar mais um avião.Matatashttp://www.blogger.com/profile/08379173464820181868noreply@blogger.com11tag:blogger.com,1999:blog-5989679.post-69106242892913529332008-01-22T12:53:00.000-02:002008-01-22T19:47:01.603-02:00A Complexa Individualidade dos Mendigos e Canários BelgasDizem por aí que existe um canário belga no Inhotim. Dizem ainda que ele vive numa gaiola. E dizem mais: dizem que as condições nas quais vive o canário belga são desumanas. Dizem que ele fica numa sala toda vermelha, sem janelas, com ar-condicionado, e que ele deveria ser libertado (na verdade, dizem “retirado”, mas presumo que não seja só um desejo de não ver o bicho e sim de que o bicho seja libertado).<br /><br />Eu digo: pare de ser hippie.<br /><br />Como alguém tem ânimo e tempo para se preocupar com um canário belga dentro de uma gaiola num museu? Se quiser demais ser engajado, existem zilhões de bichos que morrem para nos alimentar, vestir e manter com cabelos sedosos, todos merecendo mais atenção que um único solitário canário belga (que nem está sendo maltratado porra nenhuma).<br /><br />Além do que, animais são como mendigos; não têm individualidade. Mendigos são gente mas não são indivíduos, assim como uma unidade específica de canário belga é insignificante. O que importa é a sobrevivência da espécie, não o conforto individual de cada canarinho (ou mendigo).<br /><br />Eu sei, eu sei, aquele mendigo louco de bicicleta que berra músicas do Raul Seixas e toca um violão de duas cordas é <span style="font-style: italic;">super</span> único e diferente. Não é. No fim das contas, é alguém sujo, fedorento, constantemente bêbado e que dorme na rua, seja lá qual for a patologia psiquiátrica específica dele.<br /><br />Acho que isso é tudo culpa da Disney e da Pixar, com seus filmes personificando animais de forma surreal. Tentar transpor o sonho americano do <span style="font-style: italic;">self-made man</span> e da mobilidade social para o mundo das formigas ou abelhas é, no mínimo, insano. Já não basta as pessoas serem tão burras, loucas e carentes a ponto de acreditarem que o totozinho tem uma gama enorme de emoções e uma complexidade de sentimentos woodyallenesca, só porque têm algo semelhante a sobrancelhas e expressões faciais, agora elas acham que cada canário belga do mundo é um diamante precioso.<br /><br />As pessoas começam a se colocar no lugar dos animais, ao invés de pensarem e aproveitarem da única vantagem biológica do ser humano (se você não sabe qual é, provavelmente nunca usou).<br /><br />Um canário belga caga e anda se está numa gaiola numa sala vermelha; tendo comida e água, o bicho tá de boa. Bichos querem comer, dormir, beber e trepar, e nada mais. Igual a mendigos.<br /><br />O ciclo se completa.Matatashttp://www.blogger.com/profile/08379173464820181868noreply@blogger.com96tag:blogger.com,1999:blog-5989679.post-52838460256006860722008-01-18T09:56:00.000-02:002008-01-18T10:16:55.848-02:00Escola Proietti de Bom SensoNenhum creme de celulite tem 93% de eficácia, não dá para ter barriga de tanquinho com aquele aparelhinho dá choque no músculo, e ninguém que ficou bilionário com o mercado de ações vai realmente dividir os segredos em livros vendidos em aeroportos.<br /><br />Tudo óbvio, não é? Não. Por incrível que pareça, o mundo está repleto de indivíduos sem nem um toque de bom senso. São os que gastam rios de dinheiro com livros de auto-ajuda, cremes, aparelhos de ginástica, complexos de vitaminas, títulos de capitalização, e tudo para quê? Preencher o enorme vazio dentro de cada um, que grita todo dia? Ser mais rico, mais bonito, mais saudável, mais mais mais qualquer coisa, na ilusão de um dia se tornar um ser humano completo e feliz.<br /><br />Quando juntamos o vazio natural à falta obscena de bom senso da esmagadora maioria das pessoas, temos o maior mercado de todos, o da idiotice. Por algum motivo, jogo no Brasil é ilegal, porque jogos de azar não dão uma chance justa para o jogador. Mas e cremes de celulite? Que mulher em sã consciência não gostaria de ter menos celulite? E Shampoo antiqueda? Que homem em sã consciência não gostaria de perder menos cabelo?<br /><br />Idiotas trabalham e ganham dinheiro igual a todos os outros, e chegou minha vez de explorar o nicho dominado por cosméticos caros, aquelas máquinas que engolem uma fruta inteira e cospem fora suco, e, claro, Herbalife.<br /><br />Vou fundar a Escola Proietti de Bom Senso. Meus alunos serão pessoas comuns, mas que não tiveram, de alguma forma, aquela dose fundamental de desconfiança e desilusão, fundamentais para um bom senso aguçado. Os alunos viriam por recomendação dos amigos, cansados de precisarem explicar que todas aquelas frases do Big Brother que viram bordões são escritas por roteiristas da Globo, e que manga com leite não mata.<br /><br />A primeira lição (depois de descontado o cheque do módulo um) é nunca mais pagar para aprender algo impossível de ser ensinado. Depois podemos evoluir para casos mais específicos. Exemplo? Se um creme contra celulite diz ter 93% de eficácia, bom senso diz que devemos conferir no verso da embalagem, para entendermos o que exatamente quer dizer isto. O verso, claro, revela que, num estudo do fabricante, feito com 100 mulheres, 93% <span style="font-weight: bold;">perceberam alguma melhora</span> após usar o creme. Só aí temos viés, amostragem pequena e um resultado imensurável e impossível de avaliar. Mais fácil de identificar que isso, só aqueles mendigos velhinhos que, aparentemente, estão tentando voltar para Manhuaçu há 15 anos e nunca conseguem juntar o dinheiro da passagem.<br /><br />Entendeu como funciona? Agora ande na linha e pense antes de falar, antes que seus amigos façam uma vaquinha para te dar o Módulo I da Escola Proietti de Bom Senso.Matatashttp://www.blogger.com/profile/08379173464820181868noreply@blogger.com6tag:blogger.com,1999:blog-5989679.post-61355740010975074432007-12-04T13:09:00.001-02:002007-12-04T13:09:57.679-02:00Deixei meu sapatinho na janela do PinelQuando vai chegando o Natal, fim de ano e essa merda toda, as pessoas ficam retardadas. Gastam toneladas de dinheiro e tempo comprando camisas feias para pessoas que, supostamente, amam. Nada como se endividar para seu primo poder falar “putamerda, que presente escroto” no dia 25.<br /><br />Todo ano é a mesma coisa. “Vou fazer as compras de Natal em novembro, para não enfrentar fila!”. Todo ano é a mesma coisa. Dia 22 de dezembro tá lá, igual a um idiota, correndo pelo shopping lotado de outros idiotas. Roubam sua vaga no estacionamente, alguém pisa no seu pé, uma velha escrota passa na sua frente na fila, você estoura o cartão de crédito. Que delícia, deve ser aquele espírito de Natal do qual tanto se fala. Exu de Natal, só se for.<br /><br />Não vou sugerir nada alternativo para ninguém, tipo “plante uma árvore pela sua família” ou algo idiota assim. Já aprendi a não lutar contra a estupidez humana, dá muito trabalho. Tentar convencer pessoas a serem racionais e razoáveis é trabalhoso e infrutífero. Além disso, tenho esperança que meu sonho de Natal se realizará. Algum dia, depois de 4 horas procurando um boneco do Power Rangers pro filho, alguém vai surtar no Shopping e começar a quebrar tudo. Dado o estado de tensão e desespero das pessoas, é natural que espalhe e se transforme num pandemônio de classe média enfurecida, destruindo vitrines, roubando TVs de plasma, tacando fogo nas Lojas Americanas.<br /><br />Eu vou estar em casa vendo na televisão, porque, este ano, já decidi como economizar tempo e dinheiro. De quebra, fazendo algo bom para o Brasil. Isso mesmo, um presente de Natal engajado! Um presente de Natal que, além de extremamente útil, é ecologicamente correto, socialmente responsável e benéfico a todos. Prova que, mesmo na época mais egoísta do ano, alguns ainda se preocupam com os outros.<br /><br />Vou dar uma mendigo louco de presente para cada amigo meu.<br /><br />A logística é simples. Alugo uma van, compro uma garrafa de pinga e um maço de Derby para servir de isca e saio pela cidade recolhendo aquelas criaturas de dread no cabelo e roupas de saco plástico falando sozinhas por aí. Depois, é só levar no quintal, dar um banho de mangueira e embrulhar.<br /><br />Dar mendigos de presente vai ser o novo <span style="font-style: italic;">must</span> do Natal/2007. Além de baixa manutenção (um pouco de pinga, uns cigarros e um PF sustentam o mendigo durante dias, e deixam seu pêlo brilhante e macio), mendigos têm várias funções. Seu próprio mendigo sentado no chão da sala dá assunto para qualquer reunião de amigos, além de servir de mesa de centro.<br /><br />No dia-a-dia, pode ser usado como alternativa à televisão, cada dia mais insuportável. Imagine que delícia, a família inteira reunida na sala se divertindo com as imaginativas histórias do seu próprio mendigo. Papai, pede pra ele contar de novo a história de como o governo colocou um rádio na cabeça dele para controlar o que ele pensa! Não, papai, eu quero ouvir da vez que o outro mendigo roubou a última pedra dele e ele teve que chamar um demônio de oito cabeças para pegar de volta!<br /><br />Mostre o que acontece com quem não presta atenção na escola e veja seus filhos estudarem com mais afinco. Seja a inveja da vizinhança, com seu próprio mendigo. Descartável, reciclável e biodegradável, é o presente perfeito, e é minha escolha para presentear meus entes queridos este ano. Vocês que se cuidem.Matatashttp://www.blogger.com/profile/08379173464820181868noreply@blogger.com11tag:blogger.com,1999:blog-5989679.post-5086187033055616922007-11-28T15:49:00.001-02:002007-11-28T15:50:50.282-02:00Deus e DuendesUm dia ouvi, por acaso, uma discussão, cujo fascinante tema era o adesivo ACREDITO EM DUENDES. A conversa em si era ridícula; aparentemente o encontro de duas mentes resultando de várias gerações de primos reproduzindo. Já o tema é mais saboroso que uma menina de 17 anos (pensei em subir para 18, para evitar parecer doente, mas na hora desisti. Pelo menos não falei 15, igual ao Nélson Rodrigues). Isso porque, para a maior parte da população, é muita petulância rir de um adesivo ACREDITO EM DUENDES. A maior parte da população acredita em Deus, que é quase a mesma coisa.<br /><br />A vantagem que Deus tem sobre os Duendes é respaldo histórico. Ambos são figuras imaginárias, criadas por seres humanos perturbados, ou com um senso de humor por demasiado sutil para o consumo geral. Ambos possuem supostos poderes. Ambos são celebrados em adesivos de para-choques. A grande diferença é que ainda não presenciamos genocídios em nome de Duendes, nem inquisições, tortura e apedrejamentos. O máximo da fúria dos Duendes é uma experiência desagradável com ácido lisérgico. A real semelhança é quando alguém me fala que acredita em um dos dois, penso a mesma coisa: “Esse cara é um retardado.”<br /><br />A grande pergunta é, se já temos Deus, por quê surgiram os Duendes? Por um motivo muito claro. Vivemos numa era de consumismo desenfreado e escolhas aparentemente infindáveis. Tudo existe em P, M e G, em verde relaxante, vermelho rubi ou azul celeste. Temos opções para tudo, do tamanho do refrigerante ao estofado do carro. O principal efeito disso, não contando esquizofrenia e incapacidade de tomar a mais simples das decisões, é o conceito de que tudo serve para algo, mas nada serve para tudo. Não precisamos nos contentar com pacotes fechados, podemos montar nosso próprio sanduíche.<br /><br />Esse admirável mundo novo não se contenta com um Deus qualquer, um ser polivalente e único. Não acreditamos mais que um ser possa resolver tudo (ainda mais um ser que folga aos domingos). Estamos à beira de uma nova era de politeísmo; é o momento de escolher um deus para cada momento. Claro, não podemos apenas abraçar panteões do passado e esperar contentamento. A tecnologia já resolveu a maior parte dos problemas práticos; não precisamos de deuses para caça depois de supermercados e delicatessens, e qualquer navegação se beneficiaria mais com um GPS que um deus. A contemporaneidade pede deuses mais especializados, como Fuzilânio, deus das balas perdidas, e Rotatívio, o das vagas no centro.<br /><br />Até os eternos, como Amor e Guerra, precisam de alguns <span style="font-style: italic;">tweaks </span>para se adequarem aos dias de hoje. Divorcênia, a deusa do segundo casamento e Baladínio, o deus para conseguir rebocar alguma bêbada para casa de madrugada são os mais óbvios, assim como Iugoslávido, deus de pequenas guerras civis e Samfrônio, deus de invasões aleatórias dos EUA a países subdesenvolvidos. Podemos até colocar um duende no meio, só para agradar aos fritados de ácido ainda perambulando por aí. Duendes podem ser os deuses protetores das sandalinhas de couro, evitando que as tiras rasguem. <br /><br />Uma reforma completa do antigo politeísmo cai bem; a única coisa que pode permanecer continuar intocada são os sacrifícios, a parte realmente divertida de ter uma cacetada de deuses egoístas e falhos, competindo pela nossa idolatria. Seja mil anos antes de cristo ou semana que vem, sacrificar virgens num altar é sempre válido. Sem contar que vai gerar um desespero tão enorme em garotas de 17 anos para perderem a virgindade que o mundo se tornará um lugar bem mais divertido.Matatashttp://www.blogger.com/profile/08379173464820181868noreply@blogger.com17tag:blogger.com,1999:blog-5989679.post-43226650849170934382007-11-16T15:26:00.000-02:002007-11-16T15:29:06.649-02:00No Milk TodayPeço perdão aos fiéis leitores, mas hoje não tem post. Motivo? Comecei a escrever um post sobre por que não acreditar em Deus e outros assuntos igualmente inúteis, e ainda não consegui terminar. Ao invés de colocar qualquer porcaria pela metade, como costumo fazer, decidi esperar.<br /><br />Não se preocupem, terça-feira estamos de volta, com algo realmente especial.Matatashttp://www.blogger.com/profile/08379173464820181868noreply@blogger.com4tag:blogger.com,1999:blog-5989679.post-22473643775212850642007-11-13T11:18:00.001-02:002007-11-13T11:18:48.225-02:00Teoria Triplo DA vida é difícil. Vamos lá, você sabe que é verdade. Precisamos nascer, viver, amar, trabalhar, pagar imposto de renda e fingir interesse na hérnia de disco do seu tio-avô. Não é fácil, sem contar que alguns ainda têm problemas de verdade, tipo subnutrição, esquizofrenia e tios molestadores.<br /><br />Os outros seres vivos do planeta também sofrem, mas os humanos têm a desvantagem de serem conscientes e pensarem (alguns, pelo menos). A única coisa que isso gera é sofrimento e frustração. Não só vivemos numa sociedade em que fracasso e violência nos aguardam dobrando cada esquina, mas ainda por cima precisamo saber disso.<br /><br />Por esses e outros motivos, os seres humanos precisam de algo para aparar as arestas da vida cotidiana. Tudo que faz isso encaixa em um dos três Ds (como escrevo essa porra? Três Dês? Três “D”s?). Os três letra “D” no plural são, respectivamente mas em nenhuma ordem específica, Deus, Droga e Dinheiro. Alguma coisa precisa amaciar a existência, e cada um escolhe o mais adequado para seu estilo de vida. Quem não tem um, usa um dos outros, ou até dois. Deve ser possível usar os três, mas puta merda, haja angústia existencial.<br /><br />Não acredita? Mostre um servente de pedreiro que não seja crente ou bêbado ou ambos, um ateu que não seja rico ou drogado ou ambos. O D de cada um não é eterno; muitos trocam várias vezes durante a vida. É o caso de bêbados/drogados que encontram Jesus. Muitas vezes, um dos Ds é usado para eliminar outro, como no caso de afluentes que cheiram tanto que acabam precisando vender o rabo na rua para sustentar o vício, até encontrar Jesus (de novo, o filho da puta escondido por aí). Trocas involuntárias e inconscientes são trocas do mesmo jeito, e, infelizmente, muitas levam para o D mais nocivo de todos, Deus.<br /><br />Dinheiro resolve os próprios problemas que cria; os riscos maiores são ficar rico a ponto de ser sequestrado ou ser morto pelos filhos gananciosos no caso de longevidade excessiva. O primeiro é resolvido pagando o resgate ou contratando um monte de seguranças, e o segundo é resolvido com uma vasectomia ou um aborto. No entanto, dinheiro é difícil de conseguir e nem sempre resolve sozinho, e muitas vezes os ricos precisam de drogas<br /><br />Drogas são, de longe, o D mais eficiente. Não estamos falando de uma cervejinha no fim de semana, estamos falando de dois gramas de pó e oito doses de algo por noite. É difícil contemplar as sutilezas do existencialismo quando você está tão travado que nem lembra mais o próprio nome. Drogas, infelizmente, drenam o Dinheiro e acabam levando de volta ao temido Deus.<br /><br />Deus é onipotente, onisciente e onipresente, mas mesmo assim precisou de 6 dias para fazer essa merda, e ainda precisou descansar depois. Além de ser tão inseguro sobre o próprio poder que precisa de um monte de pessoas vigiando as ovelhinhas; pastores berrando estupidezes sem sentido para massas ignorantes e arrancando um naco do parco salário daquele bando de analfabetos ou padres velhos e gordos bebendo vinho e estuprando meninos de oito anos de idade.<br /><br />Mas Deus não é só roubo e pedofilia, existe um lado positivo, o de controle social. A passividade e resignação geradas por religião organizada e o sistema escolar risível do Brasil permitem que as coisas continuem fluindo do jeito que estão. Um povo analfabeto e religioso não questiona, não pensa, não critica e não entende. Mesmo as atrocidades governamentais tão absurdamente óbvias que acabam escorrendo até o consciente do povão são rotuladas de “o mundo é do jeito que é” e esquecidas. Os outros D também têm lados positivos. Drogas cuidam de controle populacional, e Dinheiro, bem, Dinheiro é Dinheiro.<br /><br />Mesmo com um leque razoável de opções, todas deixam algo a desejar. Como alternativa, existe a quarta opção, o D para iniciados. D de Desprezo; é duradouro, gratificante e definitivo. Mas, apesar de quase perfeito, não é simples. É necessário um talento inato para, mesmo sem qualquer evidência, se achar tão melhor que o resto da humanidade. Afinal, a suposta superioridade precisa ser tão firme e enraizada que torne a existência suportável. Considerar-se superior e rir da estupidez colossal do resto do mundo mantém o motor humano bem lubrificado e rodando macio, sem engasgar.<br /><br />Talvez algum a cruel realidade venha à tona e a casa de cartas caia, mas até hoje não tive problemas.Matatashttp://www.blogger.com/profile/08379173464820181868noreply@blogger.com7tag:blogger.com,1999:blog-5989679.post-2431694856527999422007-11-09T10:55:00.000-02:002007-11-09T11:22:32.491-02:00R$ 0,25O fenômeno dos guarda-chuvas perdidos está mais que bem documentado (é uma conspiração enorme conectada à misteriosa multiplicação de clips de papel no fundo da gaveta), mas muito pouco tem sido dito sobre sapatos avulsos rolando pelo mundo.<br /><br />Uma vez, há muito tempo, deixei cair uma moeda de 25 centavos no chão. Ao abaixar para recuperá-la, vi o pé esquerdo de um par de sapatos. Estava dentro de um canteiro quadrado que deveria conter apenas uma árvore, e não uma árvore e um pé esquerdo de um par de sapatos. Achei estranho, imaginei que o pé direito estivesse por perto. Procurei rapidamente nas redondezas, sem sucesso.<br /><br />Desde esse dia (conhecido como O Dia Em Que Meus Olhos Foram Abertos) tenho visto um número assustador de sapatos avulsos. Um par de sapatos na rua é algo claro e óbvio, significa que estão de tal forma destruídos que nem um mendigo gostaria de tê-los. Um único pé gera perguntas.<br /><br />Se for um sapato que literalmente <span style="font-style: italic;">desmanchou</span> no pé do antigo proprietário, é compreensível. Às vezes, a pessoa não queira se dar ao trabalho de arrastar aquele pé esquerdo até em casa, preferindo deixá-lo por onde caiu do pé mesmo. Mas, quase sempre, são pés esquerdos (ou direitos) perfeitamente utilizáveis ainda, sem qualquer falha estrutural evidente.<br /><br />Ando ficando bastante deprimido por causa dos sapatos na rua, porque a única explicação que consigo encontrar é que saiu do pé do indivíduo e por algum motivo foi deixado. Isto é, o cara não parou para recolocar o sapato. Sabe, quando você tá andando com sapatos um pouco grandes demais e eles começam a escorregar e você precisa parar e dar aquela empurradinha de calcanhar para entrar direito? Ou quando a parte de trás "pega" em algum objeto e você tem que parar e calçar o sapato de novo? É super normal, você pára e calça o sapato de novo. Se você estiver embalado a ponto de não conseguir parar, o sapato sai voando, você fica envergonhado mas volta, pega e calça, não? Ninguém continua correndo para pegar o ônibus e abandona um pé do par alí, no meio da rua, não é?<br /><br />Aparentemente, existem muitas pessoas com vidas tão excitantes, divertidas, leves, alegres e emocionantes que sapatos não importam. Pessoas felizes, satisfeitas e tranqüilas a ponto de perder um sapato sem culpa. Apenas sorriem e continuam. Provavelmente existem milhares de coisas melhores a fazer que pegar o pé perdido do sapato! Com certeza não é sem um leve prazer arrogante que a pessoa deixa o pé esquerdo (ou direito) para trás. Como quem diz, pff, sapato? Que coisa mais mundana...<br /><br />Existem pessoas tão elevadas e intrigantes andando por aí, agarrando o touro pelos chifres, flutuando no éter absortos em tecer sutis e elegantes filosofias existenciais, e nós aqui, abaixando para pegar moedinhas de 25 centavos.Matatashttp://www.blogger.com/profile/08379173464820181868noreply@blogger.com6tag:blogger.com,1999:blog-5989679.post-48674227104979473752007-11-06T01:23:00.000-02:002007-11-06T11:00:04.119-02:00Paul Rabbit<span style="font-size:100%;">O texto de hoje deveria começar com um pedido de desculpas. Ao invés disso, vai começar com uma errata e um aviso, não nessa ordem. Vai terminar com um exercício prático. E vai ter um monte de palavras no meio.<br /><br />Para evitar uma enxurrada de comentários de fãs de Paulo Coelho, o aviso. Se algum de vocês estiver lendo, pare. Sério, não é brincadeira. Pare agora. Feche a janelinha e não volte. Isso, ande com o mouse até o canto. Agora, clique.<br /><br />--<br /><br />Aos que restam (e pensam, e têm um mínimo de bom senso, etc., etc., etc.), a errata e o exercício, além do monte de palavras no meio.<br /><br />Na enquete do último post, onde lia-se "</span><span style="font-size:100%;">decida o tema da próxima <span style="font-style: italic;">enquete</span>", deveria constar "decida o tema do próximo <span style="font-style: italic;">texto</span>". Erro que passou batido, e quase veio a calhar. Uma enquete sobre o Paulo Coelho (com assustadores 59% dos votos) poderia até ser engraçada e meio nonsense, mas e um texto inteiro?<br /><br />O que existe para ser dito sobre Paulo Coelho em 500 palavras que já não foi dito? Todo mundo já sabe que os livros dele são lixo <span style="font-style: italic;">new age</span> maquiado de subliteratura. Todo mundo já sabe que o sucesso internacional só comprova que o resto do mundo é povoado por gente tão idiota quanto o Brasil.<br /><br /></span><span style="font-size:100%;">Mas, o que nem todo mundo sabe, é que ele não é picareta nem oportunista, ele é LOUCO. É um homem de 60 anos de idade correndo pelo mundo (e pelos corredores da Academia Brasileira de Letras) achando que é o Harry Potter. Pense nisso um pouco, antes de continuar.<br /><br />Ele acha que conversa com anjos, e que é um Guerreiro da Luz, de acordo com seu <a href="http://www.paulocoelho.com/">site oficial</a>. Um pouco assustador, mas suave. Doido manso. A verdadeira loucura vem à tona graças a Marilise, Lílian e Renata. A primeira Playboy que comprei foi em Outubro de 1992, com as trigêmeas na capa. Adivinhe quem foi o entrevistado? O Mágico de Oz em pessoa. Momentos impagáveis da entrevista:<br /><br /><span style="font-weight: bold; font-style: italic;">PLAYBOY –</span><span style="font-style: italic;"> O que você faz que uma pessoa normal não faz?<br /></span><span style="font-weight: bold; font-style: italic;">PAULO –</span><span style="font-style: italic;"> Sei abrir buraco em nuvem, fazer chover [...] Sei também adivinhar pensamento, mas não é sempre. E também consigo não sair numa fotografia, mesmo que tenha sido clicado.</span><br /><br />Gostou? Agora prepare-se, essa é boa. Tão boa que merece itálico e negrito.<br /><br /><span style="font-style: italic; font-weight: bold;">PAULO – [...] Ah, eu também consigo ficar invisível, sem desaparecer. Ou seja, posso fazer com que as pessoas não me vejam, mesmo eu estando diante delas.<br /></span><br />Ah, eu também quero ficar invisível sem desaparecer! Se ao menos ele explicasse como...<br /><br /></span><span style="font-size:100%;"><span style="font-style: italic; font-weight: bold;">PLAYBOY – </span><span style="font-style: italic;">Como se faz isso?</span></span><br /><span style="font-size:100%;"><span style="font-style: italic; font-weight: bold;">PAULO – </span><span style="font-style: italic;">É fácil, basta contraír os dedos dos pés e, com as mãos, fazer uma espécie de sinal de positivo com o polegar lançado para a frente e depois sair andando. Ninguém vai te ver. Não sei a razão, mas ninguém te vê mesmo.</span><span style="font-style: italic; font-weight: bold;"><br /></span></span><br />Bom, acho que depois de explicar, o mínimo seria uma demonstração, não?<br /><br /><span style="font-size:100%;"><span style="font-weight: bold; font-style: italic;">PLAYBOY –</span><span style="font-style: italic;"> Você poderia sumir agora?</span><br /><span style="font-weight: bold; font-style: italic;">PAULO –</span><span style="font-style: italic;"> Sim, mas não faria isso porque seria exibicionismo.</span></span><br /><span style="font-size:100%;"><br />Normalmente agora seria o momento de escrever mais alguns parágrafos criticando e ridicularizando o sujeito, mas nem tem graça. Nada pode superar a imagem de alguém, no meio de uma multidão, tentando andar com os dedos dos pés contraídos e o polegar em riste lançado para a frente. Se algo chega perto é imaginar as pessoas evitando olhar com medo de ser abordado pelo louco andando cambaleante fazendo "jóia" para todo mundo. Ou seja... ficou invisível, sem desaparecer!<br /><br />Agora, a parte prática. </span><span style="font-size:100%;">Mate e queime um pássaro branco hoje.</span><span style="font-size:100%;"> De preferência, mais de um.<br /><br />De acordo com o próprio mago, "</span>para começar um novo livro, estabeleci para mim mesmo um sinal - encontrar uma pena branca".<span style="font-size:100%;"><br /></span>Matatashttp://www.blogger.com/profile/08379173464820181868noreply@blogger.com9tag:blogger.com,1999:blog-5989679.post-9289632332954540992007-10-30T00:57:00.000-02:002007-10-30T01:08:57.224-02:00Pãos ou pãesFormular opiniões de forma racional e ponderada, seguindo uma moral própria acompanhada de uma filosofia pessoal de vida é tão entediante quanto se masturbar lendo a Bíblia. Bem mais atraente é decidir lá, na bucha, o que você pensa sobre determinado assunto.<br /><br />Além de economizar tempo, permite ajustar suas opiniões para ofender um número maior de pessoas. Explicar para um grupo de feministas que você defende o aborto por ser direito da mulher controlar seu próprio corpo não gera nada interessante para contar depois. Mas tente argumentar, com o mesmo grupo, que se Deus quisesse que mulheres trabalhassem, não as teria feito tão emocionais e pouco objetivas. É de momentos como esses que são feitas as memórias.<br /><br />Esse tipo de flexibilidade ideológica permite adequar seu discurso para fazer inimigos e irritar pessoas, mas pode tão facilmente te ajudar a fazer uma mesa inteira cair na gargalhada; as possibilidades de defesas hilárias para defender algo são maiores quando você não leva nada a sério.<br /><br />Aliás, levar coisas a sério é sempre uma furada. Levar coisas a sério nunca trouxe qualquer benefício à humanidade, muito pelo contrário. Pessoas sérias e com opiniões formadas sobre assuntos importantes trazem atrocidades ao mundo, como o holocausto, terrorismo, guerras santas e cientologia. Pessoas sérias são um saco, não têm senso de humor e sempre matam qualquer conversa divertida.<br /><br />Imagine como o mundo seria diferente se, por exemplo, Eichmann e Hitler tivessem sido mais descontraídos?<br /><br />– Eich, – diria Hitler, – acho que está na hora de enchermos os trens.<br />– <span style="font-style: italic;">Ja wohl, mein Führer</span>! Mas não se esqueça... – diria Eichmann, sorrindo contente.<br />– Sim?<br />– Sabia-que-todo-viado-é-surdo? – cochicharia, embolado, Eichmann, contendo a risada.<br />– O que? Não ouvi bem. – responderia o <span style="font-style: italic;">Führer</span>, perplexo. De repente, diante das gargalhadas de seu <span style="font-style: italic;">Obersturmbannführer</span>, compreensão passaria pelo rosto do ditador alemão, que, por sua vez, cairia também na gargalhada.<br /><br />Aí eles iriam a um boteco qualquer tomar <span style="font-style: italic;">schnapps</span> de cereja e rir da vida, ao invés de sairem matando judeus e russos, e o mundo seria um lugar melhor. No mínimo seria um lugar sem um filme chato por ano sobre o holocausto.Matatashttp://www.blogger.com/profile/08379173464820181868noreply@blogger.com7tag:blogger.com,1999:blog-5989679.post-62189892050360881392007-10-16T10:22:00.000-02:002007-10-16T12:13:43.078-02:00Bichas PobresBichas gostam de luxo. As ricas torram mundos e fundos com Dolce & Gabbana e Gucci, e as um pouco menos afortunadas, Zoomp e Forum. Adoram sair à noite e tirar onda, fingirem que sabem de todas as novidades de Milão e Paris, mesmo se não conhecem nem Buenos Aires. Curtem a vida adoidado e gastam loucamente; é só uma questão de quanto do orçamento pode ser destinado a roupas e saídas.<br /><br />Mas tudo tem limite. Uma coisa é uma biba disposta a gastar uma nota comprando meia da Calvin Klein e sapato bico fino da Zara; pelo menos sobra alguma coisinha no final do mês para comer e comprar lubrificante. Mas e as bichas pobres de verdade? As que não podem comprar nem Sketch? Elas pertencem a dois universos diferentes; são as Empregadinhas e Glam Perifas.<br /><br />As Empregadinhas são assustadoras; trabalham em lanchonetes, lojas de conveniência e padarias. Fazem a unha, desmunhecam horrores e são quase travas, tiram um pouco de onda, mas no fundo entendem que são pobrezinhas. Lêem Vogue com alguns meses de atraso, e tomam cerveja em butecos. Mas sempre com pose.<br /><br />Já as Glam Perifas se acham. Trabalham em lojas de roupa e moram longe pra caralho. São bichinhas que não têm onde cairem mortas, mas tomam champanhe a noite toda, antes de pegar o busão vermelho de volta para casa. Juntam dinheiro meses a fio para terem um celular de mil reais (de cartão, sempre sem crédito) e um armário cheio de camisetas apertadinhas falsificadas do Empório Armani. Afinal de contas, toda vez que uma bicha compra camiseta da C&A, uma fada morre.<br /><br />De acordo com um amigo meu, nos chats gays, antes mesmo de perguntar o tamanho do pau e se é "a ou p" (Ativa ou Passiva, para os leigos; Que Come ou Que Dá, para os REALMENTE leigos) as bichas querem saber em que bairro a outra mora, prova concreta de avaliação de status social. Por isso é que, para os pobres, os Americanos inventaram essa história de "homens que transam com homens". Porque Bicha mesmo, legítima, só rica.Matatashttp://www.blogger.com/profile/08379173464820181868noreply@blogger.com12tag:blogger.com,1999:blog-5989679.post-85572695756894601522007-10-08T09:04:00.001-03:002007-10-09T10:36:19.714-03:00OutroraA vida, como regra geral, é muito entediante. Boa parte dos segundos, minutos e horas que preenchem cada dia é gasta desejando que os segundos, minutos e horas passem logo, para termos mais um dia. Por quê? Por que somos burros.<br /><br />A vida é uma puta cara, e os segundos são infinitos pequenos cafetões, nos surrando por não podermos pagar. Já que é inevitável ficar velho e morrer, que tal um pouco de diversão antes do mergulho gelado da morte? Não é difícil ver quem entende. Velhinhos que dirigem rápido entendem, os que dirigem devagar, não. Se você tem setenta anos de idade, é bom chegar aonde está indo RÁPIDO, porque não estamos falando de alguém que pode planejar os próximos dez anos. Digamos que, depois de uma certa idade, a única garantia de pedir comida e estar vivo quando ela chegar é no McDonald's.<br /><br />Mas uma boa parcela dos bilhões de bípedes que saltitam pela terra afora não vive pelo momento, e sim pela lembrança de momentos. São bombas-relógio de casos longos e chatos, prontas para entediarem qualquer um que caia na reta. Saudosismo é o último peido póstumo de um corpo que esqueceu de viver, e seus praticantes só perdem para Testemunhas de Jeová e Mórmons na lista dos grupos mais irritantes do planeta. Do PLANETA! Nada mal, para um aglomerado desorganizado de idiotas confusos e iludidos, não?<br /><br />Agora, não pense que qualquer um pode ser saudosista; antes fosse tão fácil. Exige disciplina, desprendimento e falta de bom senso, igual pintar aqueles quadros de cavalo. É algo que não se aprende da noite pro dia; possivelmente da noite, pro dia, pra noite de novo.<br /><br />É necessário destituir tudo que é atual de qualquer valor para glorificar um passado tão idiota quanto o presente. Isso nos obriga a engrandecer trivialidades e mistificar tolices. Nos obriga a lembrar de saídas frustrantes que só nos deram ressacas horrendas como grandes aventuras urbanas, e shows horríveis de bandas incompetentes como momentos pivotais na história da música.<br /><br />Todos já passaram pela experiência horrenda de sentar à mesa com algum grupo de ex-amigos de colégio ou faculdade ou exército ou clube de swing ou seja lá qual for o grupo mais unido ao qual você já pertenceu. Ao invés de saírem e fazerem coisas e fabricarem novas memórias emocionantes e divertidas, as pessoas se agarram a versões engrandecidas de trivialidades passadas e ficam nessa, repetitivos igual almoço de natal de casa de vó.<br /><br />Alguém começa a comentar sobre aspectos da personalidade de alguém durante a época em foco no momento, os Bons Tempos, digamos. Isso emenda num “Lembra aquela vez que”, que destrói qualquer chance de alguma conversa interessante e divertida, e transforma a noite num reviver de algum momento que provavelmente nem valeu a pena experimentar da primeira vez.<br /><br />Impossível de participar; por mais que vasculhe minha memória, o único caso que me ocorre nestes momentos é a história de quando um peido meu esvaziou a sala na oitava série. Que nem lembro se é verdade, mas parece plausível.<br /><br />Será que não há solução? Será que saudosistas são iguais a cristãos, absolutamente irrecuperáveis? Talvez. Mas não há necessidade de se sujeitar a uma sessão de tortura lembraquelavez. Experimente um teste simples, como perguntar sobre a vida atual das pessoas. Se não há nada emocionante para contar, talvez não exista mais nenhuma razão para se encontrarem. O que você quer com seus colegas de colégio, afinal de contas? Quer REALMENTE saber que o filho de um deles aprendeu a bater palminhas, ou ouvir um advogado contar piadas sobre o desembargador fulano que tem língua presa?<br /><br />Ou prefere sair de perto, viver e não olhar pra trás? Lembre-se, qualquer pessoa que você vê tão pouco que precisa te contar casos do passado por falta de afinidade no presente é alguém que você só mantém como amigo se quiser estar por perto quando o casamento dele acabar e a ex-mulher estiver disponível.<br /><br />E se você achou este final fraco, desculpe. Meus textos bons mesmo são os de alguns anos atrás; naquela época eu realmente escrevia bem. Ah, bons tempos.Matatashttp://www.blogger.com/profile/08379173464820181868noreply@blogger.com9tag:blogger.com,1999:blog-5989679.post-40708311101274879012007-10-05T11:08:00.000-03:002007-10-05T11:15:04.403-03:00Madame TussaudsPara quem não sabe, a <a href="http://www.revistapiaui.com.br">Revista Piauí</a> promove todo mês um concurso literário. A idéia é pegar uma frase bizarra e encaixá-la num texto, de preferência fazendo algum sentido; o melhor texto é publicado na revista. A frase do mês de setembro era <span style="font-weight: bold;">O convite para virar estátua no Madame Tussauds lhe chegou em boa hora.</span><br /><br />Escrevi um texto, enviei e perdi. Obedecendo à minha grande amiga pregüiça, ao invés de um post normal, hoje vocês terão o prazer de correr os olhos sobre meu texto.<br /><br />Oba!<br /><br /><span style="font-weight: bold;">Viver é o Verdadeiro Terror</span><br /><br />A jovem corria, gritando, pela floresta. Olhando para trás, só via um vulto enorme a perseguindo, obstinado. Respiração ofegante, coração rasgando o peito, cada passo uma facada na perna ferida. Mas não podia parar. Se fracassasse, a morte dos amigos teria sido em vão. Mas o vulto era implacável em sua ferocidade. Cada vez mais perto, mais assustador. Ela já sentia seu hálito quente e fétido na nuca, quando um curto apagou metade da iluminação do estúdio.<br />– CORTA!<br />Marc esfregou o rosto em frustração.<br />– Dez minutos de descanso, – rosnou o diretor.<br /><br />Marc Patel estava no limite. Quase quarenta anos dirigindo filmes de terror, e sempre a mesma coisa. Eternamente às margens do circuito de cinema de verdade, relegado sempre à prateleira menos visitada da locadora, precisando se contentar com a gratidão apaixonada do pequeno grupo de fãs de filmes que se resumem a uma gostosa gritando enquanto foge de um vulto enorme.<br /><br />Suspiro.<br /><br />Seus desejos não eram extravagantes. Não precisava de um Oscar ou uma Palma ou um Leão, só de algum reconhecimento. Um sinal qualquer, algo que dissesse "Marc, os últimos 37 anos não foram jogados na privada, campeão!". Estava esperando há décadas, e finalmente cansou. Cansou de tentar assustar adolescentes e de ter úlceras. Decidiu se aposentar.<br /><br />--<br /><br />Deitado na banheira, Marc refletia.<br /><br />Reportagens sobre a aposentadoria de um dos grandes gênios do terror. Um documentário sobre a vida do maior diretor do gênero, Marc Patel. Festas. Autógrafos. Homenagens. Quase tudo que ele sempre sonhara. Menos um detalhe, aquele toque final para tudo encaixar nos moldes de seus sonhos mais secretos. O convite para virar estátua no Madame Tussauds lhe chegou em boa hora. Agora estava pronto, agora era imortal.<br /><br />Matou a garrafa de champanhe no bico, sorriu para ninguém e, delicadamente, soltou o secador de cabelos ligado dentro d'água.<br /><br />Quando encontraram o mestre do terror, estava inchado na banheira, os lábios arroxeados fixos num sorriso de feliz contentamento.Matatashttp://www.blogger.com/profile/08379173464820181868noreply@blogger.com5tag:blogger.com,1999:blog-5989679.post-19036883784204125592007-10-02T08:07:00.000-03:002007-10-02T08:08:12.978-03:00Novela para quem não agüenta o tranco.Novelas são uma bosta, e todos os envolvidos com tais atrocidades são vermes imundos que deveriam ser estuprados, esquartejados em praça pública e incinerados numa grande fogueira coletiva. Não necessariamente nessa ordem.<br /><br />“Hoje vi duas pessoas conversando sobre um homicídio brutal e, ao prestar atenção na conversa, percebi que falavam da trama de uma novela” é como mentirosos começam a escrever textos criticando cultura de massa e entretenimento barato. Parece que é impossível falar do lixo cultural vomitado pelos canais abertos sem primeiro dar um tom de Manifesto pela Libertação do Povo Alienado por Televisão. Depois disso, para arrematar, vem algo como “não é a toa que o país está do jeito que está” e “como poderíamos esperar uma democracia séria em um país onde blá blá blá”.<br /><br />Eu nunca começaria um texto assim. Começaria com um período categórico e simplista, e emendaria num resto de frase grotesco o suficiente para garantir comentários inflamados. Adoro quando alguém leva tão a sério algo que não levo nada a sério a ponto de escrever um <span style="font-style: italic;">comment</span> repleto de revolta e indignação. Continuem escrevendo, cordeirinhos inocentes, que minha ereção egocêntrica triplica de tamanho cada vez que alguém fica cego de raiva com alguma idiotice que postei neste pequeno clube de fetiches da minha própria arrogância.<br /><br />Depois, argumentaria de forma (quase) razoável, logo antes de criar uma metáfora de mal gosto.<br /><br />Absorção de bens culturais é um processo complexo, que exige conhecimento prévio e, ocasionalmente, um tipo de personalidade específico. Parágrafos inteiros de Alta Fidelidade ficam sem sentido para quem não tem um mínimo de interesse por música pop de 1965 a 1996. Para ler Cat’s Cradle e entender o conceito de Bokononismo é imprescindível um senso de humor apurado e um pouco questionável.<br /><br />Por isso é muitas vezes difícil compreender a fundo algo destinado a outros públicos, principalmente públicos mais informados. É igual sexo anal. Imagine Grande Sertão: Veredas como uma pistola enorme, e sua mente como um cu. Se for um rabo virgem e inexperiente, a entrada vai ser dolorosa e a fruição, zero. Agora, se o ânus mental já estiver arrombado e bem lubrificado, o Rosa escorregará para dentro sem o menor problema. Algumas coisas foram criadas para Cicciolinas intelectuais, cujas mentes não sentem nem cócegas com os membros diminutos e murchos da TV aberta. Já reparou como longa-metragens infantis sempre têm algumas piadas lascivas, exclusivas para os adultos? Os pimpolhos caem em gargalhadas com as besteiras mais inocentes, mas só os pais riem da putaria cuidadosamente colocada.<br /><br />Paralelamente, novelas foram projetadas para mentes que, como as de pequenas criancinhas idiotas, não captam nada além do que lhes é mostrado de forma clara e direta. Mentes que não agüentam nada além de um micropênis cultura. As novelas são a quintessência da fantasia barata, repletas de justiça cósmica e resoluções para os problemas que, na vida real, seguem atormentando a quase todos. No fim das contas, coisas boas acontecem com pessoas boas e coisas ruins com pessoas ruins. Desafio qualquer um a citar uma novela que não tinha nenhuma menina pobre que acabou ficando com um rapaz rico no final, depois de muito sofrer nas mãos de alguma megera (que acaba morrendo, diga-se de passagem). Novelas são um sonho erótico budista, de tanto carma. Sempre há um equilíbrio final de todas as forças que atuaram durante o desenrolar do tépido festival de frases idiotas e situações óbvias e superficiais que as pessoas chamam de “trama” e eu chamo de 9 centímetros, duro.<br /><br />Mas isso também é lindo. De verdade, é uma forma extremamente eficiente de entretenimento. Ajuda a suavizar a dor e o tédio da existência cotidiana, criando um mundo paralelo, onde não existe dor e sofrimento que dure além do fim da história. É um paraíso utópico de finais felizes e propagandas de margarina fantasiadas de cenas espontâneas em mesas de café da manhã. Só não é para nós.<br /><br />Por “nós”, estou falando dos seres pensantes e relativamente alfabetizados que habitam o planeta Terra, uma parcela em torno de 5,7% da população total.Matatashttp://www.blogger.com/profile/08379173464820181868noreply@blogger.com14tag:blogger.com,1999:blog-5989679.post-75401634772816754622007-09-28T09:18:00.000-03:002007-09-28T09:23:01.520-03:00Tecnologia desesperadoraPor problemas com a tecnologia, perdi o texto de hoje. O problema, na verdade, foi de burrice minha, o papel da tecnologia foi apenas de ser o facilitador para minha própria estupidez. Enfim, perdi o texto quase pronto no qual estava trabalhando, e não tive tempo de escrever outro. Assim, coloco hoje no ar uma minicrônica minha publicada no blog <a href="http://caixapreta.blog.br">Caixa Preta</a> na sexta passada.<br /><br /><br />É meio picaretagem? É. Estou orgulhoso disso? Não. Pelo menos espero que gostem da história.<br /><br /><span style="font-weight: bold;">O telefonema</span><br /><p>O telefone tocava desesperadamente. Não que isso abalasse Luciana; ela conseguiria ignorar um telefone tocando desesperadamente por horas a fio, a maldita. Como se não bastasse tornar cada dia da minha vida uma luta interna contra meu desejo de abri-la no meio com um facão. Um toque, dois, três, sete. Não agüentei e atendi.</p> <p>– Alô?<br />– Matias – respondeu uma voz amigável, porém impessoal.<br />– Sim?<br />– Aqui é Deus.<br />Não respondi. O que responder?</p> <p>– Quem é, bem? – berrou aquela vaca, lá da sala. Ela sabe como eu ADORO quando alguém fica berrando perguntando quem é enquanto ainda estou no telefone. Ignorei.</p> <p>– Matias? Está aí?<br />– Sim, sim. Deus, então?<br />– Sim.<br />– Que coisa. Nunca acreditei em você.<br />– Eu sei.<br />– Claro que sabe.</p> <p>– Bem! Quem é? – Sorte de Luciana que eu não ando armado. Continuei ignorando.<br /></p> <p>– Estou te ligando para retribuir um favor.<br />– Como assim?<br />– Uma vez, em 1984, em uma de suas descidas à terra, meu filho Jesus se viu sem onde dormir. Seus avós o acolheram, sem saber quem era. Seus avós e seus pais já morreram, então devo retribuir o favor a você.<br />– Mas isso tem mais de vinte anos…<br />– Andei ocupado.<br />– Entendo… Como funciona, então? Posso pedir qualquer coisa? Se puder, eu queria muito uns quatro centímetros a mais, se é que você me entende.<br />– Aham. Bom, poderia fazer isso. Mas sugiro outra coisa.<br />– Diga.<br />– Sua esposa está com câncer. Nem ela sabe ainda. Tem, talvez, 3 meses de vida.<br />– De verdade?<br />– Sim. Vou curá-la, e aí estamos quites. Que tal?</p> <p>– BEEEEM! QUEM É NO TELEFONE? – veio o grito lá da sala.</p> <p>– Olha, acho que eu prefiro os quatro centímetros.</p>Matatashttp://www.blogger.com/profile/08379173464820181868noreply@blogger.com3