Não Leiam Este Post

Geralmente tento ser engraçado, cínico, irônico e pelo menos um tanto quanto escroto em meus posts, mas hoje não dá. Estou mau humorado, mas não mau humorado divertido e rabugentamente cômico, mas mau humorado de chutar cachorros na rua, ou pelo menos pensar muito a respeito de chutar cachorros na rua, mas provavelmente não fazê-lo, pois cachorros na rua geralmente estão acompanhados de donos de cachorro na mesma rua, a no máximo alguns metros do cachorro. Claro, é possível argumentar que basta esperar aparecer um Dono do Cachorro seja de fato uma Dona do Cachorro, em torno de 70 anos de idade e quase cega, andando puxando a perna direita por causa do derrame e tentando não cair e quebrar a bacia, o que imagino ser a grande emoção da velhice, fugir do terrível destino de ser uma pessoa tive-uma-queda-em-que-quebrei-a-bacia-e-nunca-mais-pude-sair-da-cama-e-agora-uma-enfermeira-limpa-meu-rabo-todo-dia, ou algo assim. Desta forma, é seguro chutar o cachorro sem represálias, tirando a própria consciência pesada depois que a velha tomar um susto tão grande que cause uma queda e uma bacia quebrada.

But I digress...

Voltando ao que me inspirou a escrever este post: Conversando hoje com um amigo meu, percebi que uma coisa que tem me perturbado nos últimos tempos é que, como disse Fernando Pessoa, Estou hoje divido entre a lealdade que devo, À Tabacaria do outro lado da rua, como coisa real por fora, E à sensação de que tudo é um sonho, como coisa real por dentro.

Não sei se isso tem alguma relação com o que estou sentindo, mas pelo menos expressa uma certa sensação de dualidade, algo que está me incomodando. Especificamente, estou dividido, por um lado, entre a saudade enorme de Belo Horizonte; mais especificamente ainda, a saudade das pessoas que amo e que, por existirem, me ajudaram a criar um senso de quem sou, e à consciência cada vez mais forte de que é inconcebível morar em Belo Horizonte depois de morar em Berlim; inocência perdida ou algo do gênero. Entendam bem, não é esnobismo ou uma demonstração da mania agressivamente brasileira de desdenhar a realidade Tupiniquim, é apenas uma constatação racional da realidade. Berlin é uma cidade vibrante, cinética e em eterna mutação e movimento; é uma cidade de noites infindáveis, mas também uma cidade de manhãs memoráveis e tardes invejáveis. É uma cidade de bares e boates que nunca fecham, mas também uma cidade de parques e lagos e árvores e cafés charmosos e toda essa viadagem.

É uma cidade dividida entre o passado oriente-ocidente e a certeza de que isso não faz diferença nenhuma, tirando o fato que os Ossies (pessoas da ex-Alemanha Oriental) são quase invariávelmente mais simpáticos que seus equivalentes ocidentais. Berlim não é Alemanha, todos fazem questão de frisar este fato. CLARO que não é Alemanha, a Alemanha é um país chato e entediante cheio de gente chata e entediante, e Berlim é um diamante cravado numa coroa de latão.

É uma cidade impossível de não amar, mesmo quando o dia está cinza, frio e chuvoso, e a vontade de chutar velhinhas e cachorros está quase incontrolável.

Quem quiser reclamar que este post está um saco, por favor volte e leia o título.

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